“Em nenhum outro espaço institucional o sofrimento, o adoecimento e as emoções cheguem tão intensamente perto do profissional de saúde quanto na atenção primária”.
A frase é de José Ricardo Ayres, professor do Departamento de Medicina Preventiva da USP, ao ser questionado pelo BoletIn sobre sua participação na mesa “Sofrimento, adoecimento e emoções na produção do cuidado: o usuário, o profissional e o professor numa hora dessas?" e ressaltar a importância de entender o diverso espectro de necessidades de saúde que experimentam hoje as populações usuárias dos serviços públicos de atenção primária.
Para ele, seminários sobre integralidade são um espaço privilegiado para recarregar nossas melhores energias utópicas, para reflexão, aprendizado, troca de afetos os mais positivos entre pessoas de perfis diversos, “mas interessados todos em uma saúde pública, eficaz, integral, justa, humanizada”. “Sempre me surpreendo positivamente com esses eventos. Este especificamente, em articular, ao enfatizar a formação, me pegou pelo coração”. Confira a entrevista!
Para ele, seminários sobre integralidade são um espaço privilegiado para recarregar nossas melhores energias utópicas, para reflexão, aprendizado, troca de afetos os mais positivos entre pessoas de perfis diversos, “mas interessados todos em uma saúde pública, eficaz, integral, justa, humanizada”. “Sempre me surpreendo positivamente com esses eventos. Este especificamente, em articular, ao enfatizar a formação, me pegou pelo coração”. Confira a entrevista!
BoletIn: Como a sua experiência no Departamento de Medicina Preventiva da USP pode ajudar a responder à questão "Sofrimento, adoecimento e emoções na produção do cuidado: o usuário, o profissional e o professor numa horadessas"?
José Ricardo Ayres: O nosso Departamento tem uma longa tradição de fazer, pesquisar e ensinar em serviço, e sempre com uma atenção muito especial à questão da integralidade. Desde que foi fundado, em 1977, o Centro de Saúde Escola Samuel Barnsley Pessoa, o CS Escola do Butantã, como é conhecido, tem sido um espaço privilegiado para experimentação de modelos de atenção primária e seu ensino. Foi a partir de um modelo muito inspirado na medicina integral, inicialmente, e depois com o desenvolvimento de ações programáticas e de estratégias de saúde da família que chegamos a desenvolver o conceito de Cuidado tal como o discutimos hoje. Mais recentemente temos participado de uma experiência docente-assistencial ampliada para outras unidades básicas da região, através de um contrato de cooperação entre a Faculdade de Medicina e a Prefeitura de São Paulo, que tem sido também fonte de muito aprendizado e inspiração. Bem, se todos aqueles que ensinam saúde em situações de prática teriam muito a dizer sobre o tema, aqueles que trabalham na atenção primária por maiores razões ainda o têm. Talvez em nenhum outro espaço institucional o sofrimento, o adoecimento e as emoções cheguem tão intensamente perto do profissional de saúde quanto na atenção primária. Quando adequadamente feita, a atenção primária está ali com as pessoas, no seu dia a dia e, portanto, em contato muito íntimo com o diverso e complexo espectro de necessidades de saúde que experimentam hoje as populações usuárias dos serviços públicos de atenção primária, especialmente as mais vulneráveis e excluídas.
BoletIn: Quais serão suas contribuições no IX Seminário do Projeto Integralidade?
José Ricardo Ayres: Pretendo trazer um pouco mais dos desenvolvimentos que tenho procurado acrescentar ao quadro conceitual do Cuidado, com o qual busco contribuir para a realização do princípio da integralidade no cotidiano das práticas de saúde, em particular na atenção primária. Nesse sentido vou procurar aprofundar um pouco mais a discussão sobre a noção de "reconhecimento mútuo" com um dos elementos cruciais para o cuidado. Sem que as pessoas em interação no ato de cuidar se façam presentes, em suas condições simultaneamente singulares e compartilhadas na busca da boa saúde, é impossível que suas necessidades ganhem sentido prático na perspectiva da integralidade. Integralidade não significa dar respostas a tudo, mas dar respostas "em um todo", e essa busca de sentido para o que, como e quando fazer algo em saúde depende dessa intersubjetividade rica, desse reconhecimento mútuo. A situação se torna ainda mais delicada quando as pessoas nesta cena são usuário, professor e aluno. Pretendo ainda mostrar como é tarefa fundamental do professor transmitir ao aluno essa experiência de alteridade/identidade do usuário e de como o reconhecimento mútuo é necessário para que as tecnologias da saúde possam ser usadas para promover cuidado efetivo. Essa é uma tarefa política e ética fundamental. E ela não se restringe ao plano (importantíssimo) das relações usuário-profissional ou professor-aluno: diz respeito também à identificação de desafios prático-morais que atravessam nossas relações sociais e nossas instituições de modo amplo e radical.
BoletIn: A coordenadora do Lappis, Roseni Pinheiro, está organizando uma coletânea de seus textos. Comente essa parceria.
José Ricardo Ayres: Roseni é uma batalhadora incansável pela construção da integralidade como um princípio efetivamente operante no SUS. Ela atua em várias frentes, com um fôlego invejável. Uma delas é a atividade editorial. Então, quando Roseni me propôs publicar um conjunto de meus textos sobre cuidado, buscando com isso aumentar a circulação e discussão destas contribuições, especialmente entre alunos e profissionais que estão "chegando" na saúde, representou ao mesmo tempo motivo de muita felicidade, esperança, e responsabilidade também. Acho que o trabalho está ficando muito bonito, inclusive pela dedicação e competência de Ana Sílvia Gesteira e outros que trabalham nos "bastidores" do processo editorial e tenho uma expectativa muito positiva em relação às novas interlocuções que esta forma de veicular essa produção possa vir a produzir.
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